maio 08, 2009

Vasco Granja e os serões com cheiro a toalhas de croché

(1925-2009)
Morreu o Vasco Granja. Já sei, já sei, que foi há uns dias, mas não me apeteceu escrever nada logo, a seco. Pensei que outros estariam mais habilitados (por o haverem conhecido), a escrever o seu obituário. Suponho que me enganei. Alguns dos paralíticos da memória, intelectualmente robustecidos a farinha maizena (vocábulo em voga) costumam arrumar o Vasco na prateleira dos “camaradas”, “vermelhos” e da animação polaca e da ex. URSS. Por vezes, imagino, até lhe batiam nas costas. Agora, imbuídos do espírito rasteiro do relativismo pós-moderno, caçoam da própria liberdade (que sonham castrar) e fazendo jus à sua ignorância tremenda, esquecem-no. Ainda bem que te esquecem Vasco. Olha o que te digo, ainda bem que te esquecem. Sucede ainda que o Vasco integrou com o seu programa denominado Cinema de Animação (que durou de 1974 a 1990, entre muitas outras coisas que fez na vida), um elenco televisivo que foi, e ainda é, um lastro portentoso de, se quiserem chamar-lhe, conhecimento (o termo cultura está definitivamente morto) e do nosso imaginário. Não era, como hoje, necessário estar perto de um cine clube para conhecer o cinema que se fazia pelo mundo. Ali descobri Samuel Fuller, Herzog, Fassbinder; vi e revi Fellini, Pasolini e Rossellini. Voei nas “Asas do desejo” e ainda tive tempo para rever em ciclos a cinematografia de um determinado actor ou um realizador. Orson Welles e a “Sede do mal” bateram como uma barra de ferro na minha cabeça. As histórias de Hitchcock. A Twilight Zone. O detective Columbo. Quem matou a chabala, no denaneio do Lynch? E muitos mais. Alguns livros, ainda. Coisa pouca, era pedir demais. E acontece que ainda havia o “Acontece” melhor que o nada ou o não acontece de hoje. E as pessoas viam, experimentavam e, claro, seleccionavam. Hoje tudo isto é possível apenas em locais que normalmente se chamam espaços, atravessados por determinado conceito e conteúdos, onde a malta vai, com a postura e estilo adequados, a preceito. Berdamerda.

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